quarta-feira, 27 de junho de 2007
SALMO DO INSTANTE III
A Mário Bezerra
O tempo flui, matando o mundo,
deixando atrás as coisas gastas,
infinito desnudo e já vivido.
O tempo flui bebendo o vinho
do céu, do espaço,
e amputando as mãos de Deus.
Gastando o mundo, o tempo flui
enquanto os germes sutis da vida
são triturados à luz do sol.
Vergando de infâncias,
o tempo vai lavando o céu
como uma vidraça, uma mancha
na transparência infinita.
O templo flui,
como uma língua nos carrilhões,
ondas de luz, vozes de morte,
ecos noturnos, vento distante.
Como o momento legado
pelas memórias antigas,
o tempo flui:
a mão amiga que se foi,
a voz ausente, a hora outrora,
a madrugada lenta da alma
— a cor mais íntima que se conhece.
O tempo flui, limpando o mundo
da umidade das criaturas,
desses lugares impregnados
onde os homens se ocultam
da face dura do infinito.
O tempo flui arrasador
sobre as estrelas, sobre os espaços,
deixando apenas a alma de Deus
como a essência sobrevivente.
Yttérbio Homem de Siqueira
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