A alma é um cenário.
Por vezes, ela é como uma manhã brilhante e fresca,
inundada de alegria.
Por vezes ela é como um pôr do sol...
triste e nostálgico.

-Rubem Alves-

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quinta-feira, 28 de abril de 2011

Haicai - Delores Pires -


Iludindo o tempo
só ao relógio se engana
mas não a si mesmo.


Delores Pires
Passeio ao Luar (2002)

terça-feira, 26 de abril de 2011

E POR QUE NÓS?

(Paint by Farhad Foroutanian)

Dentro de todos nós
há uma casa vazia
escura ou clara
translúcida de vida e morte
cheirando memórias de tempo.

Dentro de todos nós
há uma casa vazia . . .

de pranto e de paz e de luz
de risos e de tardes plenas de azul.

Dentro de todos nós
há uma casa vazia . . .

quando os braços da noite
dizem das coisas vividas e
falam com olhos de menino travesso
como se caracóis e caretas de palhaço
enfeitassem nossos desenganos.

Dentre de todos nós
há sempre uma casa vazia . . .


Alvina Nunes Tzovenos
Palavras ao Tempo

sexta-feira, 22 de abril de 2011

À Noite


Este silêncio, vasto e imponderável,
revive as coisas mortas
atraindo a luz em sua corte.
...Tempo de sedar,
de transbordar as taças
com fluidos de lua -
e de brindar à noite.

Fernando Campanella

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Texto de "Alegrias de Joana", Clarice Lispector

Margarida a Violeta conhecia,
uma era cega, uma bem louca vivia,
a cega sabia o que a doida dizia
e terminou vendo o que ninguém mais via...

como uma roda rodando, rodando, agitando o ar e

criando brisa.

Mesmo sofrer era bom porque enquanto o mais baixo
sofrimento se desenrolava também se existia — como um rio
a parte.

E também se podia esperar o instante que vinha... que
vinha... e de súbito se precipitava em presente e de repente se
dissolvia... e outro que vinha... que vinha...


Clarice Lispector
Excerto do livro 'Perto do coração Selvagem',pag 57
'Alegrias de Joana'

sábado, 9 de abril de 2011

Vozes

Tempo e espaço
não me limitam.
A procura
me avizinha ao mundo.

A moça espera
quem nunca partiu,
depois abraça
o que nunca chegou.

Minha palavra
é explosão de argila.

Prisca Agustoni
in Inventario di Voci/Inventário de Vozes

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Um poema de Graça Pires (Portugal)


Um exílio começa no ferrete dos lábios
queimando o ébano dos pianos
que fazem gemer o prelúdio das mãos.
A boca, com sílabas de som tenso,
inventa os murmúrios colados ao archote
das preces que esconjuram a morte.
É invisível, como o uivo dos lobos em noites imensas,
a tormenta que nos intimida
quando, sobre o chão, nenhuma luz cicatriza
a exatidão do tempo e, como náufragos,
nos deslumbramos com a proximidade do abismo.

Graça Pires
In: 'A incidência da luz' Março 2011-

quarta-feira, 6 de abril de 2011

'Soneto de Abril'


Agora que é abril, e o mar se ausenta,
secando-se em si mesmo como um pranto,
vejo que o amor que te dedico aumenta
seguindo a trilha de meu próprio espanto.

Em mim, o teu espírito apresenta
todas as sugestões de um doce encanto
que em minha fonte não se dessedenta
por não ser fonte d'água, mas de canto.

Agora que é abril, e vão morrer
as formosas canções dos outros meses,
assim te quero, mesmo que te escondas:

amar-te uma só vez todas as vezes
em que sou carne e gesto, e fenecer
como uma voz chamada pelas ondas

Lêdo Ivo
Poesia Completa

'Outono'


Outono!
Qualquer coisa lilás,
Schumann em violino,
Ângelus tangido em lentidões de sino...
Preguiçoso torpor de um fim de sono.
Espelho de água quieta dos canais!
Cá dentro, a idade,
restos de sonho e de mocidade;
trechos dispersos
de velhas ambições falhas na vida,
parcelas de antigas ilusões
que ainda, a custo, concentro
e invoco até agora!
Lá fora, a descida.
O crepúsculo inócuo destes dias,
a tristeza das folhas amarelas,
e a cantar sobre estas ruínas frias,
a monótona toada de meus versos.
Desce, Poeta!
A descida é suave...
Não te demanda rigidez de músculos
e nem exige que teu passo apresses...
A natureza é quieta,
da ingênua quietação de um sonho de ave,
e há paina nos crepúsculos...
No outono a luz é um eterno poente,
que mais à calma que ao rumor se ajeita;
Brilha, tão de manso e calma,
que até parece unicamente feita
para o estado d'Alma
de um convalescente.


Mário Pederneiras
-1914-