A ventania que alçou o amargo aroma
do mar às espirais dos vales,
e te assaltou, desgrenhou teu cabelo,
novelo breve contra o pálido céu;
a rajada que colou teu vestido
e rápida te modulou à sua imagem,
como voltou, tu longe, a estas pedras
que o monte estende sobre o abismo,
e como passada a embriagada fúria
retorna agora ao jardim o hálito submisso
que te ninou, estirada na rede,
entre as árvores, nos teus vôos sem asas.
Ai de mim! O tempo nunca arranja duas vezes
de igual maneira suas contas! E é esta a
nossa sorte: de outra maneira, como na natureza,
nossa história se abrasaria num relâmpago.
Surto sem igual, - e que agora traz vida
a um povoado que exposto
ao olhar na encosta de um morro
se paramenta de galas e bandeiras.
O mundo existe... Um espanto para
o coração que sucumbe aos espíritos errantes,
mensageiros da noite: e não pode acreditar
que homens famintos possam ter sua festa.
Eugenio Montale
in 'Poesias'(Trad. de Geraldo Holanda Cavalcanti)
*Eugenio Montale (Génova, 12 de Outubro de 1896 — Milão, 12 de Setembro de 1981) Poeta italiano, prosador, jornalista e tradutor italiano.
Recebeu o Nobel de Literatura de 1975.
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