A alma é um cenário.
Por vezes, ela é como uma manhã brilhante e fresca,
inundada de alegria.
Por vezes ela é como um pôr do sol...
triste e nostálgico.

-Rubem Alves-

Seja bem-vindo. Hoje é
Deixe seu comentário, será muito bem-vindo, os poetas agradecem.

sexta-feira, 20 de junho de 2008

"Cartas ao "EU"


I


Meu caro eu, este é um momento em que ao meu privativo quintal eu saio. Aqui o mundo me é suave, quase digerível e palpável. Toco em uma chuva fina de cristais ralados molhando ibiscos e samambaias selvagens que emergem das fendas ao lado. As úmidas mil-folhas no vaso são pespontos em nossa alma bifurcada. Tudo aqui planamente vital. Pudesse eu saciar o coração faminto por estas ternas formas. Estes pombos sujos da ferrugem dos telhados são especiais efeitos nesta cena, neste teatro de paisagens. As nuvens concedem, às vezes, um azul, como eu, assim, que me entro, então me saio. Aqui tudo é pleno, meu amigo, tudo tão ‘esta desarmada simplicidade’, a tua mente é que bota significados, isto é, põe coisas além de coisas, vê deuses em cabeças de pombos .
Tenta refrear esta tua teimosia por signos alados. Às vezes, gosto de ir fundo em uma certa fragilidade que nos toma, então chego a sentir que de certas naturezas sopra à minha porção de tua alma um certo bucólico, velho daimon. São fantasias, talvez, e sei também que me enxergas com uma certa amiga serenidade. Uma percepção me induz agora a um pio – psiu – ouço um tilintar de luz, um saltitar de pássaro... um silêncio....um prolapso, uma abelha saindo de nosso limbo...um posfácio.

'Um jardineiro vem de meu jardim
aquelas pragas arrancar
mas de uma se esquece
e esta, sorrateira,
em brava flor
vinga o destrato.
Cinco mínimas pétalas
em cor
que a meu coração de abelha
vêm sedutoras tentar.
Obrigado, jardineiro,
sem vergonha eu te confesso,
naqueles pistilos me deito -
me esfrego
naquela flor mais rara
das tantas
que já vivi a namorar.'



F.Campanella

Nenhum comentário: