Oh, o delírio de, à noite, ouvir o vento uivando!
Vem tão de longe, rodamoinhando,
ora num ímpeto, ora brando,
a uivar em vão...
Como enche o espaço a grande voz reboando!
... e como aumenta a solidão...
O vento vem numa agonia
semeando a treva... Mal chegou,
no céu da noite, que esplendia,
as estrelas, de luz alva e macia,
as estrelas, tão claras, apagou...
Átomo no ar abandonado,
o mundo está como suspenso
no turbilhão...
Ah! Pelo espaço imenso, imenso,
o mundo vai arrebatado
no torvelinho do tufão...
Que altas montanhas, que campinas vastas,
vieste transpondo, em terras varias,
ó vento rude e mau, gemendo, só?
E, assim gemendo, que é que arrastas
pelas estradas solitárias?
- nuvens de pó... nuvens de pó...
Lá fora, entre gemidos
agoniados,
em estranha e funérea procissão,
as arvores são vultos de forçados,
caminhados de braços estendidos,
caminhando na mesma direção...
Que imensa vela palpitante
de legendário barco, ó Vento,
andas buscando, a uivar assim,
para a impelir, veloz, violento,
para um país muito distante,
por mares únicos, sem fim?
E ora, em surdina, ora, violento,
o vento passa aflito,
em turbilhão...
Oh, como sinto grande o Espaço, ó vento,
como eu sinto o Infinito
quando o enches, assim, da tua imprecação!
Tasso da Silveira
In: Poemas
Alma Heróica dos Homens