quinta-feira, 6 de março de 2008
“PARQUE DAS EMAS”
“Não façais mal nem à terra, nem às plantas
Nem às águas...”
Apocalipse
Acordei no meio da noite, e vi o dia.
Dia mais avesso que o miolo das trevas
Quando os inocentes da terra choravam,
As flores enrustiam o perfume
E o vinho amargava o sabor.
Os cavalos vermelhos desorientavam a paz da terra,
debandavam as rolas,
disparavam loucas as emas
Promessas de novas proles não se cumpriam
Que os ninhos eram cinzas por palhas
E os ovos um a um derretiam.
As falanges do fogo consumiam a obra,
calcinavam as ervas, não distinguiam
As montanhas do domínio das águas –
Onde era natural majestade, desintegravam,
Onde fossem líquidas relíquias, secariam.
Nunca se vira por estes ermos
dor tão intensa e democrática, castigando
Desde as ninfas, desfeitas de seus reinos,
Até os baleias, de suas águas desmembradas.
Os inocentes da terra choravam
Por impotentes e frágeis
Contra tão cruel e definitiva ceifa.
Antes fossem só delírios de profetas
O que o livro dos tempos anunciara.
Antes ficasse só em imagem
Este séqüito de criminosos da terra
A desfilar com suas com suas fardas em chamas
E suas bocas de vômito incandescente.
(O espírito do fogo consome a obra.
Sua língua profana lambe e devasta.
Seus dentes não deixarão grão sobre grão.)
(Fernando Campanella)
Ilustração:
Wassily Kandinsky. Moscow I. 1916. Oil on canvas. 51.5 x 49.5 cm. The Tretyakov Gallery, Moscow, Russia.
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