sábado, 16 de maio de 2009
Ilusão
Vê, que painel formoso a tarde borda
Na brilhante alcatifa do ocidente!
As nuvens em fantásticos relevos
Aos olhos fingem, que inda além da terra
Novo horizonte infindo se prolonga,
Onde lindas paisagens se desenham
Descomunais, perdendo-se no vago
De vaporosos longes
Lagos banhados de reflexos d'ouro,
Onde se espelham gigantescas fábricas;
Solitárias encostas, onde avultam
Aqui e além ruínas pitorescas,
Agrestes brenhas, serranias broncas,
Pendentes alcantis, agudos píncaros,
Fendendo um lindo céu de azul e rosas;
Fontes, cascatas, deleitosos parques,
Encantadas cidades quais só pode
Criar condão de fadas,
Surdem do vale, entre vapor brilhante,
Com a fronte coroada de mil torres,
De esguios coruchéus, de vastas cúpulas;
E além ainda mil aéreas formas,
Mil vagas perspectivas se debuxam,
Que por longes sem fim se vão perdendo!
Todo enlevado na ilusão donosa
Longo tempo meus olhos espaireço
Porém do céu as cores já desbotam,
Os fulgores se extinguem, se esvaecem
As fantásticas formas vem de manso
A noite desdobrando o véu das sombras
Sobre o aéreo painel maravilhoso;
Apenas pelas orlas do horizonte
Bruxuleia através da escuridade
O crespo dorso dos opacos montes,
E sobre eles fulgindo merencória,
Suspensa, como pálida lucerna,
A solitária estrela do crepúsculo.
Assim vos apagais em sombra escura,
Ledas visões da quadra dos amores!...
Lá vem na vida um tempo
Em que a um sopro gélido se extingue
A fantasia ardente,
Esse sol puro da manhã dos anos,
Que doura-nos as nuvens da existência,
E mostra além, pelo porvir brilhando,
Um céu formoso e rico de esperança;
E esses puros bens, que a mente ilusa
Cismara em tanto amor, tanto mistério,
Lá vão sumir-se um dia
Nas tristes sombras da realidade;
E de tudo que foi, conosco fica,
No fim dos tempos, a saudade apenas,
Triste fanal, brilhando entre ruínas!
Bernardo Guimarães
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