terça-feira, 7 de fevereiro de 2012
"VERDADE DE BRINQUEDO"
A minha verdade
é o Atlântico Amadeus Oceano:
uma saudade tão simples
que não alcanço ou espanto.
A minha verdade
é Flora pura, verbo Purim:
inteira Jazz; Moura
Paulo, Leonardo - princípio e fim.
A minha verdade
é feita de prima Vera: uma Itália
nortista, único Moai em Santiago;
esmeraldas na Serra da Mantiqueira.
A minha verdade
é tão infame quanto Rimbaud:
um espantalho, um alaúde,
“O Novo Arrabalde”: Vitória desnuda.
A minha verdade
é cigana como meus olhos e sonhos,
vã como Veneza; adora a vida em Milão:
é portuguesa como António, o Boto.
A minha verdade
é profana, sacra, rara, sacana:
é Adriana e Frida; passa por Bocage
e Camões, mas deságua seus mitos
na boca saúva da Cobra Norato.
A minha verdade
é longa e Londres, um sítio da City.
É vasta - mais que perfeita escuridão:
dela nada conheço; nela me refaço e fortaleço.
A minha verdade
foi parida em noite de Lua Cheia.
Tão urbana como minha vida em viés:
seleta e diversa como nuvens grávidas.
A minha verdade
é um pouco Dali, outro tanto daqui.
Chega de mansinho como um carinho
afoito e fortuito: um verso de areia.
A minha verdade
é benta, nada andarilha, nada Anchieta:
é como ruas vazias; crua como Alfabeto
Celta; Sevilha - Amsterdã adormecida e nua.
A minha verdade
só existe nas línguas, em todos os lábios:
é labareda Amazônica que afoga crenças
de outras eras; ressuscita tempestades.
A minha verdade
não é cômoda, nem alvo escuso:
é certeira como Jorge, reluz como
Lótus no pântano; gira sóis como Van Gogh.
A minha verdade
namora a madrugada; despeja letras
sobre folhas virgens: fatia pão e Pound,
dispensa Salomão - saúda Sandburg!
A minha verdade
é tão incerta como humanos dentes de marfim;
tão pretensa que uma criança pode imitá-la.
Mas é a minha, nem boa nem má:
apenas brinquedo, pura ilusão.
*Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
Painting by José Navarro Llorens
(Valencia, 1867-1923) foi um pintor espanhol.)
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