Na Argélia, sentiu-se o amargo “estrangeiro”:
sol a pino queimando a sua vereda morena.
Em Berlim, como em Turim, o frio augusto:
tantos graus abaixo de tristes zeros.
Tudo tão distante estava daquilo
que um dia chamara de sua "pátria"...
Na cara nevasca da sua atroz solidão,
só três perguntas ele se permitia fazer,
olhar pousado sobre a Pietà em Milão:
1. Será que a mulher provara, ou desconfiara,
d'algo além das suas palavras mais cruas;
ditas quando envoltos em lençóis de luas?
2. Será que a mulher sabia que ser o rei
tessálico era só ventura de pura fantasia?
3. Será que a mulher percebia, ou vislumbrara,
que repousava nele o ser inverso; outro e mesmo
- capaz de dizer-lhe tudo... Que suado soava,
de um jeito diverso – maroto, sublime e suave?
Nisso pensava o homem desperto, alerta
e sem rumo, dentro daquela noite em Trieste.
Nisso pensava o homem sedento, exilado,
ao mergulhar à noite, incauto, no Mar Adriático.
Tudo sentia, na boca e na alma, ao nadar
em águas itálicas: a dúvida e o estranho
gosto da sorte lançada na ardósia da plaza.
Tudo pretendia, da cabeça ao ventre, estender.
Não queria que ela, por entre outras pegadas,
confundisse seus passos-palavras com algo
menos sublime que sua mais íntima forma de ser.
*Jairo De Britto,
em “Dunas de Marfim”