domingo, 28 de outubro de 2012
''Soneto da porta''
Quem bate à minha porta não me busca.
Procura sempre aquele que não sou
e, vulto imóvel atrás de qualquer muro,
é meu sósia ou meu clone, em mim oculto.
Que saiba quem me busca e não me encontra:
sou aquele que está além de mim,
sombra que bebe o sol, angra e laguna
unidos na quimera do horizonte.
Sempre andei me buscando e não me achei:
E ao pôr-do-sol, enquanto espero a vinda
da luz perdida de uma estrela morta,
sinto saudades do que nunca fui,
do que deixei de ser, do que sonhei
e se escondeu de mim atrás da porta.
Ledo Ivo
de "Plenilúnio".
In: Poesia completa (1940-2004)
quinta-feira, 25 de outubro de 2012
''MENSAGEM''
Onde estiveres, além do arco-íris,
do mundo e das estrelas e até do
infinito se ele finito fosse.
No meu imaginário encontrei-me contigo,
parece até que o tempo está no mesmo ponto.
Que pena não poder te enlaçar, que castigo,
teu cheiro não sentir, porém, ouve este conto.
Quase nada mudou, pássaros cantam iguais,
as guerras continuam e há vírus mortais.
Aumenta a estupidez com raras exceções,
sempre buscando o ser ilusões e emoções.
As condutas humanas ainda são banais,
morre-se por tolices em ações bestiais.
Por sua perfeição a mulher não mudou,
sofrendo por amar ou porque não amou.
Cantos de parabéns nas festas continuam,
as modas vão e voltam e os desejos flutuam.
A juventude acha que domina a história,
porém todos se vão, apenas uns com glória.
Walter Dimestein
No meu imaginário encontrei-me contigo,
parece até que o tempo está no mesmo ponto.
Que pena não poder te enlaçar, que castigo,
teu cheiro não sentir, porém, ouve este conto.
Quase nada mudou, pássaros cantam iguais,
as guerras continuam e há vírus mortais.
Aumenta a estupidez com raras exceções,
sempre buscando o ser ilusões e emoções.
As condutas humanas ainda são banais,
morre-se por tolices em ações bestiais.
Por sua perfeição a mulher não mudou,
sofrendo por amar ou porque não amou.
Cantos de parabéns nas festas continuam,
as modas vão e voltam e os desejos flutuam.
A juventude acha que domina a história,
porém todos se vão, apenas uns com glória.
Walter Dimestein
Homenagem ao médico e poeta pernambucano, Walter Dimenstein,
(16.12.1924 / 25.10.2009).
(16.12.1924 / 25.10.2009).
quinta-feira, 18 de outubro de 2012
"Não deves entender a vida"
Não deves entender a vida,
seria então como uma festa.
Deixe que cada dia aconteça,
como uma criança que passa
e a cada dor
com muitas pétalas se presenteia.
Juntá-las e guardá-las
para a criança não tem sentido.
Retira-as suavemente dos cabelos,
onde tão facilmente se prenderam,
retoma os jovens e amados anos
de novo em suas mãos.
Rainer Maria Rilke
(Arte : Amanda Cass)
e a cada dor
com muitas pétalas se presenteia.
Juntá-las e guardá-las
para a criança não tem sentido.
Retira-as suavemente dos cabelos,
onde tão facilmente se prenderam,
retoma os jovens e amados anos
de novo em suas mãos.
Rainer Maria Rilke
(Arte : Amanda Cass)
"Moro entre o dia e o sonho"
Moro entre o dia e o sonho.
Onde cochilam crianças, quentes da correria.
Onde velhos para a noite sentam
e lareiras iluminam e aquecem o lugar.
Moro entre o dia e o sonho.
Onde tocam claros sinos vesperais
e meninas, perdidas da confusão,
descansam à boca do poço.
E uma tília é minha árvore querida;
e todos os verões que nela se calam
movem outra vez os mil galhos,
e acordam de novo entre o dia e o sonho.
Rainer Maria Rilke
sexta-feira, 12 de outubro de 2012
"Canção amiga"
(Tela de Emile Munier)
Eu preparo uma canção
Eu preparo uma canção
em que minha mãe se reconheça,
todas as mães se reconheçam,
e que fale como dois olhos.
Caminho por uma rua
que passa em muitos países.
Se não me vêem, eu vejo
e saúdo velhos amigos.
Eu distribuo um segredo
como quem ama ou sorri.
No jeito mais natural
dois carinhos se procuram.
Minha vida, nossas vidas
formam um só diamante.
Aprendi novas palavras
e tornei outras mais belas.
Eu preparo uma canção
que faça acordar os homens
e adormecer as crianças.
Carlos Drummond de Andrade
12 de Outubro, Dia da Criança !
todas as mães se reconheçam,
e que fale como dois olhos.
Caminho por uma rua
que passa em muitos países.
Se não me vêem, eu vejo
e saúdo velhos amigos.
Eu distribuo um segredo
como quem ama ou sorri.
No jeito mais natural
dois carinhos se procuram.
Minha vida, nossas vidas
formam um só diamante.
Aprendi novas palavras
e tornei outras mais belas.
Eu preparo uma canção
que faça acordar os homens
e adormecer as crianças.
Carlos Drummond de Andrade
12 de Outubro, Dia da Criança !
domingo, 7 de outubro de 2012
''O NEGRO FALA SOBRE RIOS''
(UM POEMA DE LANGSTON HUGHES)
TADUÇÃO DE FERNANDO CAMPANELLA
Conheço os rios:
rios ancestrais como o mundo
e mais remotos que o fluxo de sangue humano
em veias humanas.
Minha alma tornou-se profunda como os rios.
Banhei -me no Eufrates quando a aurora
era ainda criança.
Construí minha choupana às margens do Congo
que me adormecia com suas canções de ninar.
Voltei meus olhos ao Nilo e acima dele
alcei as pirâmides.
Ouvi o canto do Mississipe quando Abe Lincoln
até Nova Orleans por ele navegou
e vi seu coração lamacento dourar-se por inteiro
a cada declinar do sol.
Conheço os rios,
rios nevoentos, imemoriais.
Minha alma tornou-se profunda como os rios.
(Tradução de Fernando Campanella)
THE NEGRO SPEAKS OF RIVERS
(Langston Hughes)
I've known rivers:
I've known rivers ancient as the world and older
[ than the flow of human blood
[ in human veins.
My soul has grown deep like the rivers.
I bathed in the Euphrates when dawns were
[ young.I built my hut near the Congo and it lulled me
[to sleep.
I looked upon the Nile and raised the pyramids
[ above it.
I heard the singing of the Mississippi when
[ Abe Lincoln went down to New Orleans,
[ and I've seen its muddy bosom turn all
[ golden in the sunset.
I've known rivers:Ancient, dusky rivers.
My soul has grown deep like the rivers.
em veias humanas.
Minha alma tornou-se profunda como os rios.
Banhei -me no Eufrates quando a aurora
era ainda criança.
Construí minha choupana às margens do Congo
que me adormecia com suas canções de ninar.
Voltei meus olhos ao Nilo e acima dele
alcei as pirâmides.
Ouvi o canto do Mississipe quando Abe Lincoln
até Nova Orleans por ele navegou
e vi seu coração lamacento dourar-se por inteiro
a cada declinar do sol.
Conheço os rios,
rios nevoentos, imemoriais.
Minha alma tornou-se profunda como os rios.
(Tradução de Fernando Campanella)
THE NEGRO SPEAKS OF RIVERS
(Langston Hughes)
I've known rivers:
I've known rivers ancient as the world and older
[ than the flow of human blood
[ in human veins.
My soul has grown deep like the rivers.
I bathed in the Euphrates when dawns were
[ young.I built my hut near the Congo and it lulled me
[to sleep.
I looked upon the Nile and raised the pyramids
[ above it.
I heard the singing of the Mississippi when
[ Abe Lincoln went down to New Orleans,
[ and I've seen its muddy bosom turn all
[ golden in the sunset.
I've known rivers:Ancient, dusky rivers.
My soul has grown deep like the rivers.
sábado, 6 de outubro de 2012
Vida que se desvive
por viver, vida viva,
maravilha sedenta
coroada de ecos.
Cada murmúrio pulsa
atento a cada folha,
silêncio suspendido
por uma boca eterna.
A si mesmo sussurra
o céu canções de festa,
música a sós, e sol,
água, luz, ar e erva.
Som que ilumina fundo,
incessante milagre:
eu que me sinto ouvir,
a voz que faz memória.
A árvore na terra,
a canção sob o sol,
as folhas lá no céu,
o vento em meio às folhas.
Repleto de frescura,
meu sangue reconhece
esse frigir alado:
não há mais que universo.
Rodolfo Alonso
Tradução de José Jeronymo Rivera
por viver, vida viva,
maravilha sedenta
coroada de ecos.
Cada murmúrio pulsa
atento a cada folha,
silêncio suspendido
por uma boca eterna.
A si mesmo sussurra
o céu canções de festa,
música a sós, e sol,
água, luz, ar e erva.
Som que ilumina fundo,
incessante milagre:
eu que me sinto ouvir,
a voz que faz memória.
A árvore na terra,
a canção sob o sol,
as folhas lá no céu,
o vento em meio às folhas.
Repleto de frescura,
meu sangue reconhece
esse frigir alado:
não há mais que universo.
Rodolfo Alonso
Tradução de José Jeronymo Rivera
sexta-feira, 5 de outubro de 2012
''MÍNIMOS''
"um sopro
ninguém viu
de onde vem
ninguém sabe
aonde vai"
um vírus
quase
nada
um
ponto
na
enseada
um quantum
envieza o olhar
uma artéria
e Minas não tem bocas
e Inês é folha morta
um dedo de luz
na chuva oblíqua
um arco de cores
instala
um vôo desanda a rota
ninhos desovam
um triz
frio polar
oceanos que resvalam
torres se movem
pés desarvoram
espelhos que descamam
não consigo me achar
um mínimo
e já não me sou
de repente
algo me sonha
(Fernando Campanella)
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