A alma é um cenário.
Por vezes, ela é como uma manhã brilhante e fresca,
inundada de alegria.
Por vezes ela é como um pôr do sol...
triste e nostálgico.

-Rubem Alves-

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sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

''Ponto de fuga''


Fitam-me olhos de folhagens
molhados de chuva no jardim.
Não sei se me dizem algo
ou se trago carências de um sim.

Se imagem é degredo, ignoro –
tão míope o infinito
onde paralelas haverão de se unir.

Fernando Campanella

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Excerto do nº 3 - Livro do Desassossego -

[...] Nessas horas lentas e vazias, sobe-me da alma à mente uma tristeza de todo o ser, a amargura de tudo ser ao mesmo tempo uma sensação minha e uma coisa externa, que não está em meu poder alterar. Ah, quantas vezes os meus próprios sonhos se me erguem em coisas, não para me substituírem a realidade, mas para se me confessarem seus pares em eu os não querer, em me surgirem de fora, como o elétrico que dá a volta na curva extrema da rua, ou a voz do apregoador noturno, de não sei que coisa, que se destaca, toada árabe, como um repuxo súbito, da monotonia do entardecer![...]

Do Livro do Desassossego
Bernardo Soares 

(Fernando Pessoa)

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

''TEMPO''



Tempo essência do Espaço eterno. Tempo - fio
Da vida, mas que enleia a vida e a morte agoura,
Ligando o que hoje cria à destruição vindoura:
Cada berço nascente a um túmulo vazio!

Ilude se é veloz, engana se é tardio,
Porque só se lhe altera a força imorredoura,
Quando encanece o campo ou quando o campo aloura,
Causando o outono, o inverno, a primavera e o estio.

Transforma as cousas: cerra um astro e outro descerra.
Mas, sem que a vida enerve e sem que a morte afoite,
Mantém a coexistência orgânica da Terra.

Desvenda, aos poucos, tudo o que o mistério acoite.
E ao Sol sempre cingindo o mundo, o mundo encerra
No eterno ciclo - a aurora, o dia, a tarde, a noite.

Luís Carlos
de Columnas -(1920)
(p. 21.)

"AH!"


Ah se pelo menos o pensamento não sangrasse!
Ah se pelo menos o coração não tivesse
[memória!
Como seria menos linda e mais suave
minha história!

Antonio Carlos F. de Brito - Cacaso
In ‘Lero-lero’ (2002)

''Poema de passar o domingo.''


 Num sol sem angustias
esquento a pele
abro os poros
abro as portas
entro eu e o sol
seus raios
expulsando o escuro
e abrindo a casa
aos meus passos de volta
e aos passos incipientes
do domingo

há poeira nos móveis
limpados a pouco
em suas curvas
há poeira em meus olhos
cerrados pela clara imposição
do sol, seus raios
pela fuga das sombras

caminho para dentro
enquanto o domingo
desenrola sua teia sobre
as costas indecisas deste vate
sobre os ombros impacientes do dia...

Georgio Rios

''ENTRE O SEMPRE E O NUNCA''


Entre o sempre e o nunca
é que as coisas acontecem
um segundo sem fôlego
quando menos se espera
o mundo transforma-se

afundado em si próprio
sete corações abaixo
é que de repente se imagina
uma época em que as pedras
começam a sangrar.

Pia Tafdrup
de Tradução colectiva coordenada por Laureano Silveira
de Ponto de Focagem do Oceano, Quetzal, 2004